terça-feira, 5 de fevereiro de 2013

Acaso x Livre arbitrio

   www.nickcooper.org.uk

Recentemente assisti 2 filmes interessantes: De caso com o Acaso (Sliding Doors, ING 1998) e Incertezas (Uncertainty, EUA 2009). Ambos os filmes tratam com a questão da vida das pessoas poder ser determinada por fenômenos completamente aleatórios. No 1o filme, o fechamento prematuro (ou não) da porta do metro londrino é o fenômeno aleatório que leva a personagem Helen, vivida por Gwyneth Paltrow, a perder (foto à esquerda) ou conseguir entrar (foto à direita) no metrô que a fará chegar em casa a tempo de encontrar seu companheiro junto com a amante. No 2o filme, o lançamento de uma moeda no início de um dia leva um casal a tomar um ou outro caminho, levando-os a vivenciar situações completamente diferentes.

A princípio, pode parecer pelos seus títulos e pelos seus pontos de partida que ambos os filmes defendem o ponto de vista que a vida das pessoas é determinada por fenômenos associados ao acaso, e elas (as pessoas) são meros participantes desse jogo. Eu já acreditei nessa tese em certos momentos da minha vida. Nao sei bem o que isso tem a ver com um blog de Estatística mas achei por bem trazer essa discussão para cá. Afinal, a nossa matéria prima é a incerteza e/ou acaso e é da relevância que esses fenômenos tem na vida das pessoas que tratam os filmes.

Efetivamente, é muito raro poder determinar com precisão algumas das mais importantes escolhas que se faz na vida. Como exemplo, a pessoa com quem casamos não é escolhida dentre todas as opções disponíveis no mundo. Ela é geralmente determinada por escolhas casuais e muitas vezes alheias à nossa vontade, como a particular escola onde estudamos, o quarteirão onde fica nossa casa. E mesmo nos raros casos onde essa escolha é feita por nós, não há controle sobre quem são os nossos vizinhos ou em que turma estudamos. E essas escolhas são muitas vezes determinantes nos nossos relacionamentos.

Mas acredito que há uma instância maior onde é sim possível determinar a nossa vontade. Vamos voltar ao exemplo do casamento. Embora seja muito difícil determinarmos com quem casaremos, podemos muito bem controlar o tipo de pessoa com quem casaremos. E é isso que vai ditar o rumo que nossas vidas irão tomar em sua essência. 

Acredito que o mesmo raciocínio valha para outros aspectos da nossa vida, como nosso trabalho. Tomo meu caso como exemplo. Uma das escolhas mais importantes que tive de fazer foi onde cursar o meu doutorado. Essa escolha foi feita de forma quase aleatória, em função dos contatos que os professores que conheci ao longo de meu mestrado tinham. Eu possivelmente teria tomado outro caminho se tivesse conhecido outros professores durante meu mestrado. 

Embora eu acredite no que disse acima, não acho que isso mudaria a essência de minha atividade profissional escolhida. Ao menos no início de minha carreira profissional, os caminhos poderiam ter sido diferentes mas acredito que a essência da carreira de pesquisador em Estatística não teria sido alterada. Acho até que em poucos anos eu teria me deslocado para as áreas de pesquisa onde acabei por atuar a partir do caminho que tomei.

A dicotomia que tomei como base para essa discussão não exaure as possibilidades de determinação de nosso destino. Existe ainda uma 3a via que não é muito explorada nos romances e tem a ver com nossa constituição ao seu nível mais básico, molecular. Estudos na área da saúde mostram a existência de vários fatores genéticos que nos ajudam a determinar muitos dos nossos atos. Alguns desses estudos comprovam por exemplo que muitas das escolhas que fazemos visam aumentar a diversidade de nossa espécie humana.  É a teoria da evolução de Darwin em estado puro! Como classificar as escolhas feitas a esse nível? Seriam do nosso livre arbítrio? Afinal, são feitas por nós. Mas o são sem uma relação clara com aquilo que entendemos ser a nossa consciência. 

Poderia se argumentar que certos acontecimentos que fogem ao controle do indivíduo são determinantes do seu destino. Os exemplos mais vívidos são acidentes de carro, problemas sérios de saúde e ganhar loterias milionárias. Esses casos não ocorrem na vida da maioria das pessoas. São, portanto, as exceções que confirmam a regra. Mesmo nesses casos, existe uma proporção não desprezível de pessoas cujas vidas retornam à situação em que se encontravam antes desses acontecimentos. Fortunas são perdidas por maus negócios e problemas sérios de saúde são contornados.

E os 2 filmes que mencionei? Não quero estragar a história, para quem ainda não os viu. Mas posso dizer que, apesar dos caminhos completamente diferentes das 2 histórias paralelas, em ambos prevalece a tese que a nossa vontade é que determina o nosso destino.



Um comentário:

  1. Excelente post, Dani! Lembrou-me Freud nos momentos iniciais da criação (não descoberta, mas criação) do conceito de inconsciente psicanalítico. Sério! Muito bom! Abraços!

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