terça-feira, 8 de dezembro de 2015

Análise de sobrevivência - parte II

Gamerman (1991)

A idéia do modelo de riscos proporcionais de Cox foi introduzir efeitos de covariáveis através dessa hipótese simplificadora de proporcionalidade. Isto significa que qualquer mudança nas característica de um indivíduo produz um efeito no risco de morte que permanece inalterado durante toda a sobrevida. Por exemplo, se comparamos 2 tratamentos ou se queremos saber quanto a idade impacta a chance de morte, o modelo de Cox implica que qualquer que seja o aumento no risco de morte, esse aumento será o mesmo ao longo de toda a sobrevida.

Como consequência da hipótese de riscos proporcionais, as curvas de sobrevivência associadas a 2 condições diferentes nunca se cruzarão. Se uma curva está acima da outra, isto é, se uma condição implica maior chance de sobrevida, essa preferência será mantida ao longo de toda a sobrevida. Outra consequência é que o efeito de uma condição à qual o paciente está sujeito permanecerá inalterada. 

O trabalho de Cox foi bastante inovador para a época pela formulação alternativa que ele propos. Ele sugeriu o uso de uma verossimilhança condicional aos tempos de falha para estimar os parâmetros do modelo (basicamente os coeficientes de regressão). Não estava claro no momento da redação do artigo como essa verossimilhança podia ser deduzida e o próprio Cox não ajudou muito nessa direção, usando argumentos basicamente heurísticos, com quase nenhuma dedução matemática. Levou alguns anos e alguns bons trabalhos de pesquisa de uma coleção de pesquisadores para que se pudesse comprovar que a proposta de Cox tinha sustentação teórica e, o mais importante, estava correta. 

A hipótese de separação do efeito das variáveis explicativas para um lado e do tempo para outro lado foi fundamental para que Cox pudesse propor a sua abordagem para a inferência. Infelizmente, essa hipótese nem sempre é satisfeita na prática. Tratamentos muito agressivos são um bom exemplo. Eles costumam ter um efeito prejudicial no seu início para muitos pacientes mas o efeito torna-se benéfico para os pacientes que conseguem ultrapassar essa barreira inicial. A figura acima mostra isso para uma comparação entre 2 tratamentos de câncer do aparelho digestivo: quimioterapia e quimioterapia com radioterapia. O tratamento combinado leva a uma probabilidade menor de sobrevida ao longo dos 3 primeiros anos de tratamento mas após esse período, a sua sobrevida é maior.

Uma outra área de aplicação de modelos de sobrevivência, onde a hipótese de riscos proporcionais não é válida é a área de estudos de duração de eventos econômicos. Em estudos de desemprego, pode ser verificado que quanto maior é o salário desemprego mais demorada é a volta ao trabalho e maior é o tempo de desemprego. Isso é razoável pois, quanto maior for a sua fonte de renda, menor é a sua urgência em sair do desemprego. Entretanto, à medida que o tempo passa, o efeito do salário desemprego vai progressivamente diminuindo. Após alguns meses, esse efeito se torna desprezível e o valor do salário desemprego deixa de ter qualquer poder explicativo. Isso também é razoável pois passa a entrar em jogo não apenas a necessidade de dinheiro mas a necessidade de estar encaixado no mercado formal e ter mais tranquilidade quanto ao futuro. 

Existem várias formas de permitir riscos não-proporcionais em modelos de sobrevivência. Talvez a mais simples delas é permitir que o efeito seja das covariáveis seja localmente constante ao invés de globalmente constante, como exigido pela hipótese de proporcionalidade dos riscos. Assim, poder-se-ia estimar de forma local os efeitos a cada instante de tempo. Para evitar flutuações erráticas devidas apenas aos dados específicos coletados, comumente se impõe alguma restrição adicional de suavidade nesses efeitos para garantir que não haja instabilidade e uma variação suave dos efeitos seja obtida. Em contraponto a essa abordagem não paramétrica, existem as abordagens paramétricas onde se supõe conhecer a forma de flutuação dos efeitos. Como isso raramente acontece, é prudente adotar alguma combinação das abordagens.

Finalmente, trata-se de uma área muito querida para mim pois meu trabalho de doutoramento foi baseado em extensões do trabalho de Cox na direção não-paramétrica, descrita acima. Através desse trabalho, pude comprovar a inversão do risco em tratamentos agressivos, exibida acima, como também a decrescente influência do salário desemprego no tempo de desemprego, como ilustrado na figura abaixo. O efeito do salário desemprego é negativo mas, após cerca de seis meses, esse efeito basicamente se anula, comprovando a necessidade de modelos de riscos não-proporcionais em estudos dessa área.

Gamerman (1991)


Um comentário:

  1. Ola Professor,

    Talvez valha um primeiro paragrafo explicando a ideia do Cox no contexto em que ela apareceu (isto e, como incluir covariaveis na funcao de risco?). Para no's que ja sabemos do que se trata, o post vai direto ao ponto, mas para uma pessoa leiga que tenha lido o primeiro post, sinto que fica faltando uma motivacao para os desenvolvimentos do Cox.

    Sei que a motivacao esta espalhada pelo post, mas talvez valha a pena condensar num paragrafo introdutorio.

    Cordialmente,

    Luiz

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