terça-feira, 16 de setembro de 2014

Grandes nomes da Estatística: V - Adrian Smith

Prof. Sir Adrian Smith e eu (arquivo pessoal)

Assim como os outros nomes até agora apresentados nessa série dos Grandes nomes da Estatística (BoxCoxHarrison e Lindley), Adrian também é inglês. Diferente dos outros nomes, Adrian é uma pessoa próxima a mim e com o qual tenho tido o prazer de conviver por algumas décadas. A história profissional de Adrian é também interessante e merece ser contada aqui com o devido destaque.

Meu contato com o Adrian começou quando enviei meu pedido para fazer doutorado com ele na Universidade de Nottingham, na Inglaterra. Naquele momento, Adrian já era Professor Titular mas se deu ao trabalho de ler meu pedido e fazer comentários a respeito. Acabei optando por fazer doutorado em outra universidade inglesa mas meu interesse em interagir cientificamente com ele não diminuiu. Tanto que acabei sendo orientado no doutorado por Mike West, um de seus alunos de doutorado. Adrian também participou da minha banca de doutorado, como membro externo. Finalmente, Adrian se transferiu de Nottingham para o Imperial College, em Londres. Ai, a combinação se tornou irresistível e acabei por fazer estágio pós-doutoral de 1 ano com ele em 1994. 

O grupo de Estatística do Imperial naquela época era muito forte, seguindo a tradição iniciada com Sir David Cox, a quem Adrian substituiu. Além do Adrian, eram docentes outros importantes nomes da Estatística atual como Jon Wakefield e David Stephens, professores de importantes universidades norte-americanas. Visitantes renomados como John Nelder também frequentavam o Imperial regularmente. Entre os alunos da época podem ser citados Stephen Walker, um dos maiores nomes da atualidade em Estatística Não-Paramétrica, e Eduardo Gutierrez-Peña, um dos maiores estatísticos mexicanos e um nome importante no cenário internacional. Tudo isso fazia do Imperial um ambiente muito enriquecedor. Vivia-se a febre da 'descoberta' do MCMC e Adrian era, sem nenhuma dúvida, o grande nome aglutinador dessa movimentação. Foi lá que aprendi o que eu sei de MCMC e que ficou cristalizado em meu livro sobre o assunto.

Embora os parágrafos acima tenham sido um relato pessoal, eles ajudam a refletir um pouco da importância de Adrian para a Estatística Bayesiana das últimas décadas. Do ponto de vista estritamente científico, Adrian teve 2 contribuições fundamentais. A primeira foi a disseminação da metodologia hierárquica para a inferência Bayesiana, desenvolvida em sua tese de doutorado no início da década de 70, sob orientação de Dennis Lindley. Hoje, essa metodologia é lugar comum nos modelos utilizados mas na época mas era muito pouco usada, talvez por desconhecimento de toda sua potencialidade. Adrian desempenhou papel muito importante nesse avanço científico.

A outra contribuição está associada à obsessão que Adrian sempre teve, de tornar a metodologia Bayesiana operacionalizável. Ele sabia que essa visão da Estatística só teria futuro quando isso fosse atingido. Ele fez algumas tentativas de proposta de aproximações Bayesianas. Mas só foi lograr êxito pleno quando analisou a performance do MCMC, mostrando para o mundo que essa tecnologia se prestava como uma luva para gerar boas aproximações. Seu trabalho, realizado no início da década de 90 com Alan Gelfand, foi fundamental para a revolução do MCMC.

Esse trabalho mostrou à comunidade Bayesiana que essas técnicas serviam para resolver os problemas que eram naquele momento tratados sem muito sucesso. O seu trabalho foi complementado por um outro aluno de doutorado seu, David Spiegelhalter. David montou um grupo de trabalho responsável pela criação do BUGS, um software que cuidou da aplicação do MCMC em problemas reais. BUGS foi desenvolvido em várias plataformas (openbugs, winbugs, ...) e tornou-se um software de larga utilização por pesquisadores de diversas áreas da Ciência. Hoje, David é Professor Titular de Cambridge e tem um blog de muito sucesso internacional sobre popularização da Estatística.

Adrian ainda permaneceu algum tempo como pesquisador ativo enquanto era chefe do Departamento de Matemática do Imperial College. Foi presidente da Royal Statistical Society e tornou-se membro da prestigiosa Royal Society, a academia de ciência britânica. Mas seus interesses já começavam a caminhar em direções que lhe trouxessem novos desafios, após a sensação de dever cumprido com todo o desenvolvimento que se viu MCMC ter. Em função disso, ele aceitou ser Reitor da Queen Mary College, uma das universidades do complexo de universidades de Londres. 

Sua demonstração de capacidade administrativa em ciência foi logo percebida e o levou a um salto ainda maior: ele assumiu a direção geral de Ciência e Inovação no Department for Innovation, Universities and Skills, uma espécie de Ministério da Ciência, Tecnologia e Inovação, tornando-se responsável por toda a verba de pesquisa do Reino Unido. Sua destreza na administração acadêmica e na ciência foi reconhecida através do título de Sir, que ele recebeu no início de 2011.

Depois desse desgastante trabalho lidando com orçamentos bilionários, Adrian resolveu assumir uma carga mais leve para os padrões dele, tornando-se Reitor da Universidade de Londres.  A foto acima foi tirada em seu escritório há 1 ano em setembro de 2013, apenas 2 dias após sua posse (o que ajuda a explicar as estantes ainda vazias ao fundo). Ao mesmo tempo, ele se tornou vice-presidente do UK Statistics Authority, um órgão independente que supervisiona toda a Estatística gerada pelo serviço público inglês.

Talvez o mais importante disso tudo seja o fato de Adrian ser uma pessoa muito agradável, sem perder as características marcantes das personalidades inglesas. Extremamente inteligente e espirituoso, é sempre uma boa companhia para uma conversa. No início da década de 80, antes de ficar tão famoso mundialmente, visitou a UFRJ por cerca de 2 meses, a convite de Basílio Pereira. Infelizmente não interagi com ele naquela ocasião pois eu estava apenas iniciando em Estatística, mas sei que ele guarda boas lembranças e tem muitas histórias para contar do seu convívio na cena carioca.

3 comentários:

  1. Uma das tentativas de aproximação estudadas por Adrian foi um artigo pioneiro em uma área que hoje é conhecida como filtro de partículas e tem atraido a atenção de uma grande quantidade de pesquisadores em diferentes áreas da Ciência e não apenas em Estatística. Seu artigo foi publicado em 1993 e um periódico de Engenharia que ném é dos mais cotados. Apenas de um esforço inicial, já cuidava de alguns dos problemas fundamentais de esquemas de aproximação sequenciais, que é a degeneração das partículas. Agradeço a Basílio pereira por ter me relembrado dessa outra importante contribuição de Sir Adrian Smith

    ResponderExcluir
  2. Sir Adrian passou três meses no Brasil em 1980 e as notas de suas aulas e palestras estão disponíveis na biblioteca do IM/UFRJ .
    O conteúdo é Modelos Lineares Bayesianos e as palestras, topicos das teses de seus alunos na época: West, Spiegelhalter e Makov. Destas palestras se ve um prenuncio dos filtros de partículas.

    ResponderExcluir
  3. Na realidade o grupo de estatística do Imperial College se iniciou com George Barnard um dos maiores estatísticos ingleses. Barnard antes de lecionar no Imperial College, durante a segunda guerra liderou um grupo no Ministry of Suply analogo ao que Wald liderou nos Estatois Unidos na época.
    Entre os membros do grupo e que começaram a trabalhar em estatística através de Barnard estavam Dennis Lindley e Peter Armitage. Outro grande estatistico que esteve no Imperial College na epoca de Barnard foi Gwimly Jenkins conhecido por seu trabalho em series temporais (Box-Jenkins). Entre os alunos de doutorado de Barnard estava Godambe.
    Basilio

    ResponderExcluir