terça-feira, 25 de março de 2014

Probabilidades imprecisas

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Chamou-me particular atenção no último EBEB a presença de apresentações tratando de temas relacionados a diferentes formas de ver probabilidades. Uma das questões tratadas foi a possibilidade de permitir que a probabilidade não seja dada apenas por 1 número mas por um intervalo de valores. Esse tipo de abordagem seria útil em situações onde não nos julgamos preparados para fornecer um único número para representar a probabilidade de um evento.

Como exemplo, poderiamos estar preparados apenas para dizer que a probabilidade de dar cara no lançamento de uma moeda é um número no intervalo que vai de 0,4 a 0,6 ao invés de apenas dada por 0,5, como comumente assumimos. Alguém poderia dizer que não há razão para não cravar 50% no caso de uma moeda mas o leitor facilmente encontrará exemplos envolvendo situações mais elaboradas onde existe uma razoável incerteza sobre o valor da probabilidade.

Eu tive contato com pesquisa sobre esse tipo de preocupação teórica há algumas décadas, quando realizei meu doutorado. Naquela época (anos 80) apareceu uma profusão de propostas de alternativas ao conceito de probabilidade, algumas delas oriundas de áreas correlatas como computação e engenharia de sistemas. Estava começando o boom dos computadores pessoais e havia uma espécie de euforia para testar novas possibilidades de cálculo na presença de incerteza. Tudo isso vinha atrelado ao desenvolvimento de inteligência artificial. Outro conceito muito popular naquela época foi o de fuzzy logic ou lógica nebulosa. Esse conceito é bastante similar à idéia de probabilidades imprecisas em termos qualitativos.

Surgiram idéias de todos os tipos. Algumas úteis que sobreviveram até hoje e outras ném tanto. Lembro de ter ouvido uma palestra de um pesquisador que trabalhava com uma medida para avaliar incertezas que variava de -1 a 1. Ou seja, procurava mapear probabilidade para valores positivos e também negativos. Não sei que fim levou essa proposta mas nunca mais ouvi falar dela. Alguns conceitos que também desempenham papel similar ao da probabilidade perduraram mais na área de inteligência artifical, como o conceito de belief function.

Mas desde então confesso que não vi mais menções a esse tipo de linha de pesquisa ném nos periódicos científicos que consulto ném nos congressos que participo. Mas uma busca na internet indica não só que a área está viva mas que existem sociedades internacionais dedicadas ao estudo de probabilidades imprecisas e que reuniões específicas sobre esse tema são realizadas com regularidade.

Podemos estabelecer um paralelo dessa época com a época atual onde vemos um grande desenvolvimento da área conhecida como machine learning (atrelado a big data). Essa área em si merece uma postagem específica mas genericamente seu objetivo final me parece similar: dotar máquinas (das mais variadas) de sistemas automáticos capazes de decidir na presença de incerteza sem precisar da intervenção de seres humanos no processo decisório. E novamente observa-se uma profusão de propostas, muitas delas, fortemente baseadas em probabilidade e inferência Bayesiana.

Alguém me perguntou durante o congresso se eu via futuro nessas técnicas. Devo confessar meu ceticismo sobre tentativas como essa, de propor alternativas ao cálculo de probabilidades, mesmo reconhecendo a pertinência de probabilidades imprecisas em vários problemas que lidamos. Mas o futuro dirá se essa forma de pensar sobre probabilidade irá prosperar ou não.

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