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Decisão tomada na semana passada (dia 02/02/2017) designou o ministro Edson Fachin como relator dos processos da Operação Lava-Jato no Supremo Tribunal Federal (STF). Essa decisão se tornou necessária após a morte do ministro Teori Zavaski, que relatava esses processos. Ela foi tomada por um sorteio virtual* envolvendo os 5 ministros do STF que compõe a 2a turma do STF, responsável pela Lava-Jato. Esse sorteio procurou dar mais chances aos ministros que possuíam menos processos sob sua alçada. Esse critério procura distribuir os processos de forma mais equilibrada entre os ministros, seguindo o procedimento de praxe usado a cada novo processo que chega ao STF.
A importância da Lava-Jato na história recente do país vem atraindo a atenção de toda a sociedade brasileira a cada novo passo. Isso amplifica a dimensão de cada assunto e a melhor ilustração dessa dimensão foi a quantidade de teorias levantadas a respeito do acidente aéreo que vitimou o ministro Zavaski. Também não ajudou o fato do ministro Fachin ter migrado para a 2a turma do STF e assim poder participar do sorteio poucas horas antes de sua realização.
O sorteio em si também despertou interesse já que, a princípio, parecia ser aleatório mas depois foi esclarecido pela mídia ser ponderado conforme descrito acima. Procurei no site do STF alguma explicação sobre o esquema de ponderação mas não encontrei nada. A origem dessa informação veiculada pelos meios de comunicação me pareceu ter sido a jornalista Vera Magalhães. (Veja também o vídeo onde ela explica que sua fonte foi constituida pelos próprios ministros do STF.) A notícia foi a partir dai repercutida nos mais diversos meios de comunicação. Também tentei contato com a jornalista mas até agora não obtive retorno.
Acredito que um aspecto importante do serviço público é a transparência e capacidade de ser verificado por cada cidadão. O STF segue essa descrição fornecendo no seu site informação sobre o andamento dos processos que estão lá sendo tramitados e até permitindo a presença do público de forma física ou virtual através de
seus canal de televisão e rádio abertos a toda a população.
Causou surpresa que a regra de ponderação usada no sorteio não tenha sido explicitada. Essa postura foi criticada na mídia nacional. Ela não se coaduna com a disponibilização de informação descrita no parágrafo anterior e serve para introduzir mais ruído que colaborar para acalmar o momento delicado que vivemos na política nacional.
Como exemplo, foi amplamente divulgado pela grande mídia que a ponderação adotada implicava em aumento irrisório, de no máximo 1%. Por outro lado, se informou que por conta dos pesos era esperado que o sorteado fosse o ministro Fachin por ser o atual detentor de menor número de processos. Ora, se o aumento foi mesmo de no máximo 1% não havia porque alguém achar que o sorteado teria de ser o ministro com maior probabilidade. Só há 2 explicações plausíveis para esse aparente paradoxo: desconhecimento dos aspectos básicos do cálculo de probabilidades ou influência muito mais significativa dos pesos atribuídos a cada ministro.
Exercícios simples mostram que as probabilidades de escolha podem variar enormemente dependendo da forma que o número de processos entra na ponderação. Existem inúmeras formas de implementar essa ponderação mas, como ilustração, suponha que a probabilidade do juiz F ser escolhido é determinada pelo inverso no número de processos elevado a alguma potência a, isto é,
Prob[A] = k / { Processos [A] }^a onde Processos [A] é o número de processos com o ministro A.
Imagine simplificadamente também que 4 juízes do sorteio tenham 100 processos e um ministro F tenha apenas 10 processos.** Se a=0, não há ponderação e todos os juízes teriam os mesmos 20% de chances. Se a=0,1, o ministro F passaria a ter 24% e os outros juízes 19% de chances de serem selecionados. Ou seja, haveria um aumento discreto de chances para o ministro F. Agora, se a=1, o ministro F passaria a ter 71,4% e os outros juízes 7,14% de chances de serem sorteados. Nesse novo esquema de ponderação, o ministro F teria chances 10 vezes maiores de ser sorteado que qualquer outro ministro.
As contas acima tornam mais concreta a perplexidade gerada pela escassez de informação. Até acredito que a explicação seja mesmo o desconhecimento de matemática e probabilidade por parte da população em geral e da mídia. Mas tudo isso poderia ter sido evitado com a divulgação pelo STF da regra utilizada. Não fere em nada a independência e a relevância do STF e ajuda a população a acompanhar melhor o que está acontecendo e as decisões que estão sendo tomadas.
Ganha o STF e ganha o país.
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* - Vale informar que não existe nenhum problema técnico com o fato do sorteio ser virtual.
** - As contas não mudam se as quantidades de
processos de todos os ministros fossem duplicados, triplicados ou
multiplicados por 10. Assim, qualquer erro meu na
quantidade de processos do STF é imaterial.
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