terça-feira, 12 de fevereiro de 2019

A tragédia recorrente do Rio


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Assim como na postagem da semana passada, falamos novamente de uma tragédia nacional. Novamente, falamos de uma repetição de tragédia recentemente ocorrida na mesma região. A maior diferença é que esta tragédia acontece todo ano, alguns com maior gravidade e outros com menor gravidade. Trata-se de temporais na cidade do Rio de Janeiro. 

Já é de conhecimento de todos que a região sudeste do país está sujeita a fortes chuvas no verão, especialmente nos meses de janeiro e fevereiro. Lembro ainda criança de um temporal na cidade há cerca de meio século, que inundou o bairro de Laranjeiras de tal forma que ao final foram vistas verdadeiras esculturas de automóveis empilhados após terem sidos arrastados pela correnteza formada pela chuva na rua principal do bairro. Houve também deslizamentos que causaram mortes e tristeza para parte da população do bairro.

O que acontece da cidade do Rio é a conjugação de fenômenos esperados pela natureza mas que se magnificaram por vários motivos. O aumento substancial da população nessa região aumenta as chances desses fenômenos, já esperados como disse acima, causarem mais estragos materiais e pessoais pelo simples aumento da população a eles exposta. Assim, é comum vermos várias pessoas atingidas pelos temporais de verão nas cidades mais populosas do país, Rio e São Paulo. 

No caso do Rio, entretanto, existe o agravante da ocupação desordenada da cidade em encostas de morros, alguns muito íngremes. Isso aumenta o risco global de mortes no Rio em relação à capital paulista. De fato, todas as mortes ocorridas nesse último temporal tiveram relação direta com deslizamento de encostas. Isso é esperado em relevos tão íngremes como o carioca. Só que poucos desses locais tem tanta aglomeração urbana como na cidade do Rio de Janeiro. Além desses fatores habituais, temos novos fatores adicionados à essa receita. 

O primeiro deles é o fator climático. É inegável que estamos atravessando um período de mudanças no clima. Neste ano, a cidade teve o máximo histórico de temperaturas médias no mês de janeiro. Nunca um janeiro foi tão quente. Embora o máximo seja temporalmente fortuito, evidências auxiliares reforçam a existência de uma mudança. O verão de 2016 também houve recorde de temperatura. Embora não esteja diretamente relacionada à tragédia recém-ocorrida, a temperatura elevada é indiretamente relacionada, por causar aumento da evaporação da água na superfície. 

Isso nos leva ao motivo principal da tragédia, que foi a chuva ocorrida na semana passada. Choveu em poucas horas um excesso de chuva com respeito à média histórica de chuva nos meses de fevereiro, que são meses reconhecidamente chuvosos. A quantidade de chuva estava entre as maiores já ocorridas. Novamente vale lembrar que entre as maiores quantidades de chuva já observadas na cidade há uma presença substancial de chuva na última década. Isso reforça a tese da mudança climática. Note que essa observação é meramente empírica e não tem relação direta com os estudos que apontam o aquecimento global.

Estamos vivendo uma era de extremos climáticos e alternâncias imensas em diferentes fatores climáticos vem sendo observados com frequência crescente. Recentemente, houve uma nevasca no leste da América do Norte com temperaturas extremamente baixas. Na semana seguinte, a temperatura chegou perto dos 20 graus Celsius (positivos!) na cidade de Nova York, em pleno inverno.

Um outro componente que não pode ser esquecido é o componente econômico. O Estado do Rio de Janeiro passa por um momento particularmente difícil com dívidas enormes e comprometimento total de sua receita com pagamento de pessoal. Isso implica uma diminuição dos aportes a todos os serviços, com a precarização deles como consequência inescapável. Isso vale para a saúde, para a educação e para a segurança pública mas vale também para os programas voltados a mitigar os efeitos das intempéries do destino no Estado.

Essa conjugação de fatores acaba explicando a tragédia anunciada pela qual os cariocas foram obrigados a passar. A perspectiva futura não é boa, a começar com a forte chuva prevista para a noite de hoje. Vai envolver uma mudança de mentalidade de diversos aspectos por parte da administração da cidade e do Estado e isso leva tempo. Resta-nos torcer que os administradores públicos atuais e futuros percebam a importância desse redirecionamento de atitude, gestos e ações.

PS: uma postagem falando em tragédia no Rio na semana passada não pode se furtar a lamentar profundamente o ocorrido no Centro de Treinamento de futebol do Clube de Regatas do Flamengo. Ela não parece ter sido causada pelo temporal embora ele possa ter danificado os equipamentos de ar condicionados causadores de mais essa tragédia carioca. Desejamos um pronto re-estabelecimento do clube e as mais sinceras condolências aos familiares dos meninos que perderam suas vidas na luta pelo sonho de ascensão social.

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