Há algumas semanas, publiquei uma postagem sobre o assunto do título. Naquela postahgem, foi alertado que os dados lá reportados ainda não eram definitivos pois muitos bolsistas contemplados ainda não tinham assinado compromisso de aceitação da bolsa concedida. Passadas algumas semanas e estando mais próximo do prazo final para essa confirmação, vale a pena revisitar os dados para verificar se o padrão apresentado lá atrás se manteve.
Novamente com o auxílio da Profa Glaura Franco, foi revisado o levantamento da postagem anterior. Relembrando, a postagem apresentava uma (suposta, naquela ocasião) discrepância entre a proporção de bolsas de pesquisa preservadas na área de Probabilidade e Estatística em 2020 com relação às correspondentes taxas de preservação de bolsas de áreas próximas no mesmo período. Os dados atualizados estão reportados na tabela abaixo
Tabela 1. Dados relativos à alocação de bolsas de pesquisa para 2020 (revisado)
Área do conhecimento
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Percentagem de preservação
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Percentagem de bolsas renovadas
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Percentagem de bolsistas novos
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Matemática
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86%
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55%
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31%
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Computação
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82%
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64%
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18%
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Engenharia
de Produção
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106%
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71%
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35%
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Probabilidade
e Estatística
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29%
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29%
|
0%
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Agora, a diferença entre as taxas de bolsas preservadas na área de Probabilidade e Estatística e as das outras áreas citadas ficou ainda maior. Um aspecto de menor importância que também pode ser observado da Tabela 1 foi o discreto aumento do número de bolsas da Engenharia de Produção. Como isso pode ser conseguido em um cenário restritivo do ponto de vista orçamentário?
Uma análise mais detalhada das alocações de bolsas concedidas talvez possa ajudar. Antes, vale explicar que as bolsas estão essencialmente alocadas nos níveis 1 e 2 e o custo para o CNPq de uma bolsa nível 2 é em torno de metade do custo da bolsa de nível 1. O aumento no número de bolsas da Engenharia de Produção se deveu ao aumento de bolsas de nível 2, menos onerosas. O número de bolsas de nível 1 efetivamente foi reduzido. Assim, o gasto total com bolsas dessa área permaneceu nos mesmos patamares. O cenário na Matemática foi diferente: houve um aumento expressivo (34%) nas bolsas de nível 1, mais onerosas, acoplado a uma ainda mais expressiva redução (56%) nas bolsas de nível 2.
Cumpre reforçar que essas alocações são escolhas autônomas dos comitês decisores e não há nada de errado com elas. Apenas nos cabe apontar que cada decisão tem uma consequência diferente e não há uma única receita ótima.
Mas o dado que mais chama atenção na Tabela 1 é a proporção marcadamente menor de bolsas da área de Probabilidade e Estatística em relação às outras. Para isso, contribuiu a redução de 100% das bolsas nível 2, parcialmente devida à promoção de alguns bolsistas para o nível 1. Essa discrepância é ainda maior quando se considera apenas a Estatística, que teve apenas 1 de suas 10 bolsas preservadas, numa taxa de preservação de apenas 10%. Com essa taxa de preservação, não surpreende que a área não teve a entrada de nenhum novo bolsista.
Esse quadro não é novidade para a comunidade da Estatística. No final de 2018, foi divulgado o resultado de uma chamada do CNPq para o Edital Universal, onde são concedidos recursos para utilização genérica de apoio a projetos de pesquisa. Dentre os 71 projetos contemplados pelo CA-MA, comitê de avaliação das área de Matemática e Probabilidade/Estatística, apenas 1 foi de Estatística. Esse resultado ligou o alerta em parte da comunidade mas pouco foi feito a respeito naquela ocasião, talvez por achar que se tratava de evento fortuito e meramente casual. O resultado recente parece indicar a presença de uma tendência.
Além disso, uma pesquisadora da Estatística fez um pedido de bolsa de pesquisa recentemente, logo após publicar resultados de sua pesquisa em um dos periódicos de elite da área. [Esse fato é raro na Estatística brasileira apesar da produção em periódicos em bom nível ter aumentado.] Ao invés de ter seu pedido aprovado por esse comitê com elogios pelo seu feito, seu pedido foi rejeitado. Pedidos de outros pesquisadores que, embora meritórios, não possuíam indícios similares de excelência foram privilegiados. Esse tipo de decisão desestimula a busca pela relevância da produção científica, especialmente entre os jovens pesquisadores. Um amigo, pesquisador de prestígio, me disse certa vez que projetos de pesquisa deveriam sempre "mirar a lua".
Em resumo, algumas decisões que o CNPq vem ultimamente tomando para a área de Estatística preocupam aqueles que almejam o efetivo crescimento da Estatística no país. Acredito que esse crescimento seja o desejo de todos que querem ver os recursos alocados para a Ciência e Tecnologia sendo usados da forma mais efetiva possível em todas as áreas da Ciência nacional. A figura que abre esta postagem reflete o sentimento que vem tomando muitos pesquisadores de Estatística do país neste momento. Só nos resta esperar que esse movimento represente apenas um deslize e as medidas necessárias para que essa tendência possa ser revertida sejam tomadas.
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