terça-feira, 14 de julho de 2020

Atualizações na pandemia e no projeto CovidLP


O projeto CovidLP foi descrito aqui há algumas postagens. Desde então muita coisa aconteceu dentro e fora do projeto com relação à Covid19. Gostaria de falar aqui sobre algumas delas. Elas envolvem novas manifestações da pandemia e a resposta do projeto a elas, bem como outras novidades do projeto. Procurarei descrevê-las aqui na medida do seu relacionamento com o projeto.

O primeiro e mais importante aspecto dessa pandemia é o afastamento do padrão estabelecido para pandemias/epidemias. Normalmente uma epidemia apresenta um comportamento de aumento de casos seguido de um decréscimo nos casos. Esse padrão segue a lógica do crescente aumento da infecção devido ao maior número de suscetíveis, seguido do decréscimo decorrente da diminuição desse último número. Entretanto, esse padrão tem sido quebrado pela mudança no nível de isolamento. Com o relaxamento do isolamento, novos grupos de suscetíveis se expõe ao contágio, permitindo uma nova onda de crescimento. Essa epidemia já havia exibido esse comportamento em alguns poucos países. O caso mais vistoso era o do Iran. Neste momento, que vários países já encerraram um seu (primeiro?) ciclo, estamos vendo esse ressurgimento de crescimento de contagens em uma série de países, como Estados Unidos.

Um fenômeno aparentemente similar tem sido observado em alguns países. Se o país é muito heterogêneo, o comportamento da pandemia em suas diferentes regiões tem diferenças marcantes. O início da pandemia varia muito temporalmente. No caso do Brasil, a pandemia começou pelos estados de Rio de Janeiro e São Paulo, onde estão situados os principais pontos de entrada de estrangeiros no país: os aeroportos. Além disso, o próprio formato do crescimento depende de políticas de testagem e, principalmente de políticas de isolamento, sobre os quais as decisões em esfera estadual tem grande relevância. Apesar de diferentes, esse fenômeno pode ter uma expressão em número de casos e de mortes muito parecida com a que identificamos com os fenômenos descritos no parágrafo que o antecedeu. Eles são são usualmente denominados de 2a onda.   

A forma mais simples que pode ser usada para representar matematicamente essa 2a onda, ou mais geralmente qualquer onda adicional, é a inclusão de uma curva logística adicional na formulação do modelo. Embora conceitualmente simples, a implementação dessa idéia não é tão simples quanto parece. O maior problema advém da dificuldade do modelo saber separar as 2 curvas que se somam para descrever uma única série temporal observada. Várias tentativas estão sendo adotadas para permitir essa identificação e estão sendo testadas. Espero poder reportar sobre elas em breve. 

Outro aspecto relevante a ser considerado é a correta especificação da variabilidade dos dados. O projeto CovidLP vem utilizando a especificação Poisson, por ser a mais natural para lidar com contagens. Entretanto, experimentos realizados com os dados dessa epidemia mostram que a variabilidade dos dados tem se revelado muito maior que a permitida pela Poisson. Faz-se necessária uma especificação que permita essa sobredispersão. Existem várias opções disponíveis na literatura estatística, incluindo a mais conhecida: a binomial negativa. Entretanto, todos os experimentos realizados até agora apontaram para uma especificação que, embora mais adequada em termos de ajuste, tem levado a previsões com muita incerteza. Após poucos dias a frente, os intervalos que refletem a incerteza das previsões ficam tão largos que praticamente tornam inócua qualquer inferência. Tentativas de minimizar o tamanho da incerteza, sem chegar à estreiteza dos intervalos oriundos da Poisson, ainda estão em curso.

Outro aspecto que tem sido muito comentado por aqueles que tem trabalhado com dados da pandemia é a dificuldade de obter estabilidade nas sucessivas projeções que são rotineiramente feitas e de atribuir confiabilidade nas previsões a longo prazo. Efetivamente, tem sido observadas mudanças constantes nas estimações não apenas pela pouca robustez dos modelos utilizados. As condições sobre as quais se desenvolve a pandemia em muitos países tem exibido flutuações consideráveis o que torna previsões de longo prazo ainda mais incertas. Uma busca na literatura mostra que essa não é uma prerrogativa dessa pandemia. Críticas à performance de modelos de previsão para epidemias tem sido publicadas. A fala do reitor da UEM ao fim de minha palestra a essa universidade ajuda a entender porque as projeções seguem sendo usadas apesar de todas as ressalvas. Ele essencialmente disse que as previsões não são feitas para indicar o caminho mas tão somente para jogar luz sobre ele.

A disseminação do projeto deu origem a vários instrumentos de interações com a academia e a sociedade. De fato, o projeto foi feito para isso. O aplicativo já deu origem a um site e um blog. O site divulga aspectos associados ao aplicativo, como detalhamento da metodologia, instruções para melhor compreensão dos resultados (ilustrado na figura acima) e repercussões na sociedade (mais sobre isso no próximo parágrafo). O blog serve como um espaço para interação mais direta com os usuários. Embora ainda subutilizado, ele serve para ouvirmos sugestões e até críticas. 

Vários convites para apresentações do aplicativo foram feitos para a equipe responsável. Além disso, houve interesse para utilização dos resultados em algumas instâncias oficiais, tanto a nível municipal quanto a nível estadual. Esperamos poder atingir ainda mais secretarias de saude municipais e estaduais espalhadas pelo país.

A mais recente ferramenta a ser disponibilizada é o pacote. Ele vem atender uma demanda que rotineiramente recebemos de usuários, interessados em analisar as regiões de seus interesses pessoais.  ele está sendo desenvolvido com descrição, exemplos e ajuda. Esperamos que essa facilidade tenha o potencial de angariar uma maior utilização dessa ferramenta.

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