terça-feira, 10 de maio de 2016

Porque o futebol é a maior fonte de outliers no esporte?

http://nerdesporte.blogspot.com.br/2013/06/deu-zebra.html

A tese que o futebol é o maior gerador de outliers no esporte foi levantada na postagem da semana passada por conta da conquista do título inglês por conta do azarão Leicester. (Esses fenômenos inesperados são costumeiramente descritos aqui no Brasil como zebras.) De fato, as casas de apostas inglesas cotavam esse evento com uma taxa de 5000:1. Para se ter uma idéia de quão extremo é essa avaliação, o fato de Elvis Presley ainda estar vivo é cotado a 2000:1! Em função da concretização de acontecimento tão extremo, as casas de apostas inglesas estão até revendo suas estratégias.

Assim, o evento era considerado muito extremo e semana passada se materializou, dando algum suporte à tese explicitada no título. Para defender essa tese de forma mais consistente, é preciso entender aspectos que diferenciam o futebol dos outros esportes e como eles impactam a ocorrência de eventos extremos.

O aspecto mais importante do futebol é o elemento definidor de uma partida: o número de gols. É notória a escassez desse elemento em uma partida de futebol. É muito raro ver resultados de partida com mais de 10 gols. Mesmo a célebre vitória da Alemanha sobre o Brasil na semifinal da Copa, que foi a pior derrota da nossa seleção, teve menos de 10 gols. E em geral, partidas são decididas com muito menos gols. Isso impõe ao futebol uma lógica diferenciada de muitos outros esportes. 

Em todos os jogos, independente da  qualidade dos oponentes, são oferecidas chances de marcar gols para ambos os times. Alguma vezes, um time tido como mais fraco consegue concretizar alguma(s) dessas chances. Dependendo de uma série de fatores como tempo de jogo, local do jogo, condições climáticas, etc..., esse resultado positivo consegue ser preservado até o final da partida. Isso é inimaginável em outros esportes coletivos como volei, basquete, handebol. Esses outros esportes são caracterizados por placares com contagens altas e a idéia de impedir o seu oponente de marcar pontos não é operacionalizável. 

Isso está relacionado com resultados limites de probabilidade como a Lei dos grandes números (LGN). Esse importante resultado nos informa que repetições sucessivas tendem a se estabilizar em torno de sua média global. Traduzido para o esporte, a existência de muitas repetições leva a estabilizar resultados em torno de sua desempenho médio. Assim, equipes de melhor desempenho tendem a obter melhores resultados e vencer as competições. Isso vale para vários outros esportes. Por exemplo, para vencer uma regata no remo são necessárias um alto número de remadas similares e vence quem as fizer em média da melhor forma, mesmo se algumas poucas não tiverem sido boas. Raciocínio idêntico vale para as braçadas na natação e as passadas nas corridas de atletismo.

Um outro esporte onde o imponderável poderia ter peso similar ao do futebol é o judo. Nessa modalidade esportiva, basta um golpe perfeito para a luta ser vencida. Nesse ponto, o judo seria ainda mais sujeito ao imponderável que o futebol pois o golpe termina a luta (equivalente ao gol de ouro do passado recente do futebol). Entretanto, o requerimento de perfeição do golpe introduz um maior controle e uma maior influência da estabilidade.

Muitas das competições mais importantes do futebol são torneios de poucos jogos. A Copa do Mundo é o torneio de futebol mais importante e constitui um bom exemplo. Uma equipe precisa realizar apenas 7 jogos até chegar ao titulo e os 3 primeiros nem são muito importantes (a Itália foi campeâ em 1986 com 3 empates nesses jogos). Assim, o número de jogos que relamente conta é 4. Trata-se de um número muito pequeno para invocar alguma estabilidade advinda da LGN. 

Várias copas nacionais e continentais de clubes seguem um esquema similar. Logo, não chega a ser raro ter equipes de menor porte sendo campeãs de copas. Nesse ponto, o feito do Leicester é ainda mais digno de nota pois o título não foi obtido em uma Copa de poucos jogos. Ele foi obtido em um longo campeonato com 38 rodadas ao longo de 8 meses, onde a estabilidade adquire uma maior proeminência. Trata-se assim de um verdadeiro outlier de grande magnitude.

Um comentário:

  1. É difícil fazer previsões para o futebol. Um modelo preciso seria como a pedra filosofal para os apostadores. Vale registrar essa iniciativa http://www.mat.ufmg.br/futebol/pergunta2.html . E na gaveta dos projetos que esperam sua vez, a ideia de adaptar o modelo do prof. Scott para o Rugbi https://www.stat.auckland.ac.nz/~dscott/ . Como ele mesmo adianta, "não é uma ciência inacessível, é apenas estatística".

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